Quando o algoritmo decide quem é “improdutivo”: a demissão em massa do Bancão e a dignidade humana
- Bruno Ezagui
- há 5 dias
- 2 min de leitura
Nos últimos dias, ganhou repercussão a decisão do chamado “Bancão” de demitir cerca de 1.000 colaboradores, justificando publicamente que seriam “ineficientes e improdutivos”. Mais grave do que o desligamento em si, foi a forma como esse processo foi conduzido e amplificado na mídia, deixando marcas profundas na imagem e na possibilidade de recolocação profissional desses ex- colaboradores.
O episódio levanta um debate urgente sobre ética corporativa, dignidade da pessoa humana e os limites da gestão algorítmica.
O tribunal dos algoritmos
Segundo relatos, as demissões se basearam em dados de fiscalização e microgerenciamento extraídos de algoritmos que monitoravam atividades de forma invasiva.
Não houve feedback construtivo, planos de desenvolvimento ou oportunidade de evolução. As decisões foram frias, matemáticas, e culminaram em rótulos públicos altamente pejorativos.
Transformar pessoas em estatísticas de “ineficiência” não apenas desumaniza o ambiente de trabalho, como mina a confiança no mercado, pois abre espaço para que colaboradores temam constantemente a vigilância e o julgamento de métricas descontextualizadas.
E a pecha aplicada de pessoas ineficientes e improdutivas na imagem profissional desses 1000 seres humanos? Será que agora uma empresa tem o direito de além de demitir, condenar pessoas ao desemprego perpétuo e impedir sua recolocação no mercado?
Uma comparação incômoda: e os presidiários?
A legislação brasileira proíbe que empresas exijam atestados de antecedentes criminais como requisito para contratação, justamente para não impedir que pessoas que já cumpriram suas penas tenham oportunidade de ressocialização e trabalho digno.
Ou seja, como podemos observar, até quem cometeu crimes tem direito a não ser reduzido ao seu passado.
Se o Estado garante essa possibilidade, como aceitar que um banco exponha e rotule publicamente trabalhadores sem histórico criminal, limitando de forma definitiva suas chances de recolocação?
O impacto humano e jurídico
A conduta do “Bancão” não fere apenas a sensibilidade social, mas pode também ensejar debates jurídicos relevantes, como:
Assédio institucional: transformar demissões em um ato de desmoralização pública.
Dano moral coletivo: ao rotular ex-colaboradores, a empresa atinge não só os demitidos, mas toda a categoria profissional.
Violação de princípios constitucionais: a dignidade da pessoa humana e a valorização do trabalho foram frontalmente ignoradas.
A Aplicação da Pena de Morte Social: porque destrói a reputação dos trabalhadores perante o mercado, criando um estigma que dificulta a recolocação. Seria pior que a aplicação da justa causa, tendo em vista que o colaborador certamente será estigmatizado ad eternum.
Dumping social reputacional: expressão que pode ser usada para descrever práticas empresariais que, em busca de competitividade ou “limpeza de imagem”, destroem a dignidade de empregados, causando exclusão e degradação no mercado.
Empresas precisam rever seu papel
A gestão baseada apenas em números e algoritmos pode até trazer ganhos imediatos de eficiência, mas cobra um preço alto em imagem, confiança e responsabilidade social.
Organizações que desconsideram a humanidade de seus colaboradores correm o risco de transformar eficiência em desumanização. E, no longo prazo, esse custo é insustentável.
Outro ponto, é que a maioria das empresas dizem ter programas de compliance robusto!
Porém fatos como esse demonstram um Programa de Compliance de papel, um folder escrito e entregue para impressionar, stakeholders, mas que na prática, ignora necessidades humanas básicas de compliance trabalhista
Nesse aspecto a demissão em massa do “Bancão” não é apenas um caso isolado de gestão equivocada, mas um alerta para toda a sociedade corporativa: o futuro do trabalho não pode ser construído sem humanidade.
Se até aqueles que já erraram têm o direito de recomeçar, é inadmissível que trabalhadores sejam condenados à invisibilidade profissional apenas por decisões frias e rótulos depreciativos.
Mais do que números, empresas lidam com pessoas, e essa é uma verdade que nenhum algoritmo pode apagar.
#demissãohumanizada #compliancetrabalhista #rh #penademortesocial #dumpingsocialreputacional #assédioinstitucional #danomoralcoletivo
Bruno Ezagui
Comentários